quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Excelente artigo de quem já combateu o trabalho escravo contemporâneo

Quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Michel Temer e o maior ataque à fiscalização de combate ao trabalho escravo no Brasil


Durante dois anos e meio fiz parte do Grupo Móvel de Combate ao Trabalho Escravo do Ministério do Trabalho. As cenas que caracterizam o trabalho escravo no campo brasileiro são muito parecidas. Mas essa que vou narrar aqui se trata de uma operação realizada em 2014 no sudoeste do Estado do Maranhão, da qual participei.
Eram 11 mulheres e homens, trabalhadores rurais, que em sua maioria chegavam a trabalhar 14, 16 e alguns deles até 18 horas por dia. Isso mesmo. Dezoito horas por dia. Não tinham descanso semanal remunerado, nem os intervalos legalmente previstos para repouso e alimentação ou o intervalo obrigatório  entre duas jornadas de trabalho (chamado de intervalo interjornada). Não recebiam salário. Trabalhavam pela parca comida que lhes era entregue para cozinharem em um fogareiro improvisado ao chão de terra, movido à lenha recolhida por eles ali mesmo no pasto onde foram colocados para morar.
Antes de cozida, a carne ficava exposta ao sol rodeada de moscas e o restante do alimento ao chão do barraco de lona que mal os abrigava ao dormir. Deixava-os expostos às intempéries, a animais peçonhentos e expunha completamente sua individualidade. Dormiam todos juntos, mulheres e homens, famílias, casados e solteiros. Ao lado desse barracão onde dormiam, um córrego, utilizado para retirar água para beber e cozinhar e, nesse mesmo mesmo córrego, satisfaziam suas necessidades pessoais. Vacas e cavalos da Fazenda também bebiam dessa mesma água barrenta.
Como Auditores-Fiscais do Trabalho, constatamos situação de trabalho escravo contemporâneo com previsão no artigo 149 do Código Penal Brasileiro, por dois motivos: jornada exaustiva e condições degradantes de trabalho. Isso porque o fato se deu ANTES da Portaria 1129/2017, publicada essa semana pelo Ministro do Trabalho.
Pasmem! Se o Estado Brasileiro se deparasse com essa mesma situação narrada depois da publicação dessa Portaria, não se trataria mais de situação “análoga à de escravo”.
O Governo Temer excluiu, com a referida portaria, duas hipóteses de caracterização de escravo no Brasil, justamente aquelas que foram utilizadas para caracterizá-lo na situação narrada acima. Agora, portanto, com a portaria, só será considerado “trabalho escravo contemporâneo” as situações em que houver trabalho forçado ou restrição à liberdade de locomoção.
Para que um trabalhador seja considerado escravo, a partir da Portaria, ele deve ser forçado a trabalhar ou ter seu direito de locomoção restringidos.
O atual estágio do capitalismo periférico brasileiro dá aos patrões o luxo de escravizar sem precisar amarrar os trabalhadores. Com um desemprego que bate as cifras dos 14 milhões, o empregador se dá ao luxo de escolher entre uma massa de miseráveis que esperam à sua porteira para trabalhar para ele e enriquecê-lo em troca de favores e de suas migalhas.
Mas não é porque o atual estágio do sistema capitalista empresta ao empregador mais esse privilégio (o de escravizar sem chicotear) que o trabalho em condições degradantes ou em jornada exaustiva deva deixar de ser considerado trabalho escravo.
Não! Muito pelo contrário. É nesse momento que as leis e as normas devem servir para proteger ainda mais os trabalhadores que perdem empregos, salário e condições dignas de trabalho e de vida. O que essa portaria faz é estimular a utilização de trabalho degradante no Brasil ao retirar a “degradância” e a “jornada exaustiva” dos elementos caracterizadores do “trabalho escravo contemporâneo”.
E o governo o faz de forma autoritária, como lhe é de praxe. Por portaria, altera previsão expressa na letra da lei, no artigo 149 do Código Penal. Em 20 anos, mais de 55 mil trabalhadores foram resgatados de condições de trabalho escravo contemporâneo no campo e nas cidades brasileiras com fundamento no artigo acima.
Mas ela não para por aí. A portaria também introduz outros requisitos para a caracterização do trabalho escravo que funcionam no sentido de dificultá-la. Por exemplo, exige a lavratura de Boletim de Ocorrência por autoria da policial que tenha participado da fiscalização. Acontece que, na maioria das vezes, a caracterização do trabalho escravo se dá em inspeções de rotina dos auditores fiscais em que não há acompanhamento policial. Nesse caso, a exigência de lavratura de Boletim de Ocorrência introduz mais um requisito que a dificultar o processo de caracterização do trabalho escravo já que ela só poderá se dar na minoria delas, ou seja, naquelas fiscalizações em que há acompanhamento policial.
Além disso, há alteração no Processo de divulgação da “Lista Suja” do Trabalho Escravo. Trata-se de um cadastro de empregadores flagrados utilizando mão de obra escrava. Atualmente, a lista suja é minuciosamente elaborada por uma equipe técnica de auditores-fiscais do trabalho. A Portaria altera a competência de divulgação da Lista Suja e passa a atribuir à pessoa do Ministro do Trabalho a competência para divulga-la e para incluir empregadores na lista. Isso é um absurdo pois submete um importante instrumento do combate ao trabalho escravo à pessoa às inclinações políticas do Ministro do Trabalho.
Estímulo à utilização de mão de obra escrava ao eliminar a “jornada exaustiva” e a “degradância” do rol dos elementos caracterizados do trabalho escravo contemporâneo, o Ministro do Trabalho, através dessa Portaria, realiza o maior ataque à fiscalização do Trabalho Escravo que o Brasil já experimentou.
É o governo Temer mostrando a que veio. 
Lucas Reis da Silva é historiador e Bacharel em Direito. Auditor-Fiscal do Trabalho.

Fonte: http://justificando.cartacapital.com.br/2017/10/18/michel-temer-e-o-maior-ataque-fiscalizacao-de-combate-ao-trabalho-escravo-no-brasil/



Quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Desrespeito ao teto remuneratório. Isto também acontece em outros estados

Justiça paulista dribla teto remuneratório

Notícias de agências, jornais e revistas / Judiciário / Jornal Valor Econômico

Jornal Valor Econômico

Por André Guilherme Vieira
19/10/2017 - 05:00

Verbas conhecidas como "vantagens pessoais, eventuais, indenizações e gratificações" garantem a desembargadores estaduais paulistas ganhos que ultrapassam R$ 100 mil mensais, em valores brutos, permitindo aos magistrados driblar o teto remuneratório constitucional.

De janeiro a setembro de 2017, cada desembargador de São Paulo já ganhou R$ 605,8 mil em vencimentos, considerando a média dos valores brutos recebidos.

Aos 440 desembargadores e juízes substitutos do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) também é facultada a conversão de quase todo tipo de benefício recebido em dinheiro.

Férias de juízes podem ser ilimitadamente acumuladas e convertidas em remuneração. Licenças-prêmio também. O mesmo ocorre com a compensação a plantões judiciais realizados nos fins de semana. Cada plantão cumprido dá direito a dois dias de folga, que, do mesmo modo, podem ser convertidos em remuneração. A cada cinco anos, desembargadores têm direito a três meses de licença-prêmio.

O subsídio (salário básico) dos desembargadores, de R$ 30,4 mil, corresponde a 90,25% da remuneração paga aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), de R$ 33,7 mil. Ao menos na teoria, é o vencimento de ministro do STF que estabelece o teto de pagamentos a todos os demais magistrados do país.

O portal da transparência da Corte de Justiça de São Paulo não especifica a composição de pagamento por rubrica, fato que ensejou a criação do termo "caixa-preta", usado com ironia por alguns advogados para se referir aos rendimentos dos magistrados. Juntas, as verbas conferem altos salários aos juízes estaduais que julgam processos em segunda instância.

Somam-se às indenizações por férias ou afastamento da função por "absoluta necessidade de serviço", auxílio-alimentação e moradia, vantagens pessoais e eventuais, abono de permanência (equivalente à contribuição previdenciária, a pretexto de estimular o juiz que já dispõe de tempo para aposentadoria a permanecer em atividade), gratificações e 13º salário.

Também é direito de todo juiz paulista antecipar a primeira parcela do 13 º salário no mês de seu aniversário. Não se trata de privilégio exclusivo dos magistrados. A lei assegura essa prerrogativa a todos os servidores públicos estaduais paulistas, incluindo os da máquina estadual, membros do Ministério Público de São Paulo (MP-SP), promotores e procuradores de Justiça.

Desembargadores, juízes, procuradores e promotores recebem ainda, mensalmente, o pagamento de diferenças e correção monetária do auxílio moradia. A chamada Parcela Autônoma de Equivalência (PAE) é referente ao período de 1º de setembro de 1994 a 31 de dezembro de 1997 e é paga a título de isonomia com os deputados estaduais, que receberam o benefício na década de 90.

As remunerações da PAE também não estão individualizadas na transparência do TJ-SP, mas variam entre R$ 9 mil e R$ 11 mil mensais para cada desembargador, segundo apurou o Valor com magistrados ouvidos sob condição de anonimato.

O principal argumento do TJ-SP para justificar os contracheques gordos é o de que apenas a remuneração base é levada em conta a fim de se considerar o teto remuneratório limitado pela Constituição.

Mas ocorre que, frequentemente, vantagens pessoais, indenizações e outros pagamentos ultrapassam a "remuneração paradigma" recebida pelos juízes, resultando em valores brutos superiores aos R$ 100 mil.

Na média, em valores líquidos, os desembargadores já embolsaram R$ 488,7 mil no período de 9 meses deste ano. No ano passado, o Tribunal de Justiça paulista consumiu R$ 10,7 bilhões, de acordo com dados disponíveis no Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

O maior vencimento pago a desembargador do TJ-SP em janeiro foi de R$ 106,5 mil. O vencimento-base desse magistrado naquele mês foi de R$ 30,4 mil. No entanto, ele ficou com R$ 93,2 mil líquidos - mais do que o triplo do valor da "remuneração paradigma".

Ainda que a folha de pagamento de janeiro possa ser considerada atípica por se tratar de um mês em que há acúmulo de indenizações por férias, os contracheques dos outros 11 meses do ano evidenciam que os ganhos mensais dos desembargadores estão quase sempre além dos R$ 33,7 mil. Na prática, não existe um teto remuneratório.

O presidente do TJ-SP, Paulo Mascaretti, informou por sua assessoria de imprensa que o portal da transparência do tribunal "está formatado segundo as balizas estabelecidas pelo CNJ".

Segundo o presidente da Corte, foi determinada a realização de estudos para aprimorar as informações da transparência e "a versão atualizada do portal estará disponibilizada neste exercício".

Indagado sobre o acúmulo ilimitado das férias, e a possibilidade de que sejam pagas em dinheiro, Mascaretti negou se tratar de um privilégio.

O magistrado alegou que a indenização por férias é um direito constitucional assegurado aos trabalhadores e que a atividade jurisdicional é obrigatoriamente ininterrupta.

"A solução mostra-se, ainda, benéfica aos cofres públicos, pois a contratação de novos magistrados ensejaria o pagamento de vencimentos em montantes muito superiores àqueles hoje dispendidos por esta Corte Estadual de Justiça com a conversão em pecúnia de férias e outros afastamentos", alegou o presidente do Tribunal de Justiça paulista.

Sobre o fato de as remunerações dos desembargadores superarem em até 60% o limite legal, Paulo Mascaretti disse que "a remuneração paradigma de todos os magistrados paulistas observa estritamente o teto constitucional".

Segundo o presidente do tribunal, "outras verbas porventura agregadas a este valor são pagas nos exatos termos da lei e de resoluções editadas pelo Conselho Nacional de Justiça; não se tratando, como muitas vezes se afirma de 'penduricalhos' despropositados."

Indagado sobre o número sem igual de desembargadores em São Paulo, Mascaretti disse que "cargos públicos são criados por lei" e que a avaliação do CNJ é de que o TJ-SP "apresenta adequado aproveitamento dos valores orçamentários que lhe são destinados, exibindo custo por processo em tramitação inferior à média nacional".


Registre as histórias, fatos relevantes, curiosidade sobre Paulo Amaral: rasj@rio.com.br. Aproveite para conhecê-lo melhor em http://www2.uol.com.br/bestcars/colunas3/b277b.htm

Eis o veículo (Motorella) que tenho utilizado para andar na ciclovia da Lagoa e ir ao trabalho sem suar