quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Fashion Law: considerações e 1º Congresso sobre o Tema, no Rio Janeiro

Valor Econômico - EU & Estilo - 07.11.2012 - D6

Cópia de vestido? Imitação? 'Fashion law' neles

Por Angela Klinke

O nariz de André Mendes é acionado enquanto caminha pela avenida Paulista, rumo ao escritório. O advogado capta o cheiro da Abercrombie & Fitch em pleno fumacê de São Paulo e fica intrigado. " Ué, será que abriram uma loja no Brasil e eu não fiquei sabendo?" Ele ajeita os óculos de grau Chanel e decide seguir a pista da novidade. Vai respirando fundo até dar de frente com mais uma unidade da, surpresa!, Vila Romana. "Marketing olfativo faz parte da identidade da marca. Não pode ser simplesmente 'emprestado'."
Veja só, não se trata de pirataria, de um rascunho declaradamente fora da lei. É marca legalmente constituída se mimetizando em aspectos de outra marca legítima. Mendes sabe que se tivesse visitado a mais recente edição da São Paulo Fashion Week, como também as anteriores, iria ampliar seu álbum de ctrl C, ctrl V de estampas, modelos, maquiagem etc. Para um moço que valoriza o caimento perfeito de um terno sob medida Ermenegildo Zegna ou Ricardo Almeida, sapatos "su misura" Stefano Bemer, gravatas Salvatore Ferragamo ou Hermès, um criador tem direito total sobre a sua criatura.
"Acho incrível conversar com os estilistas brasileiros que fazem moda autoral e eles considerarem que ser copiado é um dado de realidade, que não há nada a ser feito para se defender disso." Os conflitos agudos entre cópia e inspiração surgem de uma constatação muito simples: a moda trabalha com a apropriação do cotidiano, ninguém parte do zero, nada é novo. Então, vale tudo, certo?
Mendes integra um grupo de especialistas que pretende dar contornos legais a esse mundo sem fronteiras. Como coordenador da área de "Fashion Law" do escritório L.O Baptista SVMFA, será um dos palestrantes do primeiro congresso do tema a ser realizado no país, no dia 30 deste mês, no Rio de Janeiro. A modalidade foi oficialmente delineada quando Susan Scafidi, guru de Mendes, criou a cadeira de Fashion Law na Universidade Fordham, em Nova York, há cinco anos.
A organização do evento é do grupo Tie, que entre suas frentes tem o site "Solte a Gravata.com", cujo o lema é o "direito não está apenas nos livros, petições, dentro das salas de aula ou dos escritórios, mas sim no cotidiano das pessoas". O congresso conta com patrocínio da indústria - nesta edição, da Firjan -, mas tem a pretensão de ser um catalizador para que o "direito da moda" ganhe musculatura.
Hoje, quem tem uma peça xerocada nas vitrines nacionais enfrenta um verdadeiro calvário para reverter o prejuízo. Caso tivesse o interesse de patentear um produto, levaria no mínimo dois anos para conseguir um registro no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). "O direito não dá conta da velocidade da moda", diz Mendes.
O caminho encontrado por criadores como Oskar Metsavaht, da Osklen, conta Mendes, é criar seus próprios dossiês. "O Oskar identifica as peças que acredita que vão virar best-seller e arquiva todo o processo de criação." Tudo entra na documentação: a troca de e-mails, a negociação com o fornecedor, a imagens de referência, até a música que a equipe ouviu no momento de desenvolvimento do produto.
Evidente que não é uma vivência tranquila e glamourosa. Ainda é difícil ser reconhecido por ter reintroduzido o saruel no estilo de vida resort. Mas Metsavaht já consegue, conta Mendes, acionar uma grife carioca de sapatos pela reprodução de seus tênis de couro. E você sabe de qual estou falando, não é? Pois é, porque o tal modelo já é reconhecido como um tênis "tipo Osklen".
Mesmo com um verdadeiro raio-X do processo de criação, não há garantia de que o juiz diferencie uma blusinha de uma toga. Há varas empresariais de primeira instância no Rio de Janeiro, mas mesmo elas não dão conta da singularidade da moda. "Estamos falando de estilo de vida, do design, do catálogo, de iluminação da vitrine, da arquitetura, de um perfume, da imagem de uma modelo, de toda a construção de um conceito. É muito mais que fazer uma blusa idêntica a outra. Quantos juízes hoje no Brasil têm conhecimentos técnicos para o tema? Que perito tem subsídios para avaliar?", questiona Mendes.
É por isso que, além do congresso, Mendes e entusiastas da causa, como a advogada Mariana Valverde - ex-modelo e coordenadora da frente na Valverde Advogados -, estão reunindo integrantes do setor para criar o primeiro instituto de "fashion law" no Brasil, que seria mantido pela inciativa privada. "Começamos as conversas com a Fiesp, a Inbrands e estilistas e sabemos que o interesse é real, inclusive de colaborar financeiramente. As marcas de luxo também devem fazer parte", diz Mendes. A proposta por meio do instituto é criar cadeiras de "fashion law" nas faculdades de direito, capacitar peritos para poder atuar nos processos, municiar criadores para se protegerem.
Na França, onde o "savoir faire" da moda é reconhecido como parte da cultura, os juízes já desfrutam de uma intimidade maior com o tema. Existem estilistas "amigos da corte", profissionais que são chamados para balizar as decisões. "O que buscamos é o entendimento da moda como um ativo cultural. Mas para isso precisamos de juízes mais preparados e familiarizados com o tema e peritos que sejam da própria indústria."
Mas como não dá para erguer o cajado e abrir o mar, Mendes também trabalha na proposta de criação de um código do setor, uma espécie de Conar da moda. Seria uma forma mais rápida e menos pretensiosa de atuação do que conseguir logo uma nova legislação. Só para ilustrar, não custa lembrar que o STJ, alheio a certos aspectos da mundanidade, só liberou as advogadas de usarem calças nas sessões de julgamento no ano 2000. Pelo menos, foi a tempo da virada do século.
Nos Estados Unidos, Susan Scafidi tem feito lobby junto a senadores democratas para a elaboração de uma lei para o setor. Por lá, o tema já ganhou dimensões políticas. No cenário internacional, o momento permite até que questões mais profundas sejam discutidas. Por exemplo, como ficaria o modelo de fast fashion nos moldes como conhecemos hoje?
Todo mundo sabe que esses varejistas captam o que está sendo feito pelos criadores e colocam o produto rapidamente em suas araras globais. Reproduzir em velocidade as passarelas é a essência desta indústria. "Uma das ideias é criar um delay nesse processo. Por exemplo, o criador teria três meses para usufruir de seu trabalho com exclusividade antes dele entrar no fast fashion", explica Mendes. Mas aí, seria só fashion, não fast, não é?
A legislação francesa da década de 50 permitia que uma peça de moda fosse copiada desde que classificada como démodé. Mas já naquela época quem iria dizer o que estava ou não na onda? É de se imaginar que quando os parâmetros do "fashion law" forem estabelecidos já estarão defasados. A tecnologia acelera tudo e também provoca taquicardia no coração da moda. Mas, quem sabe até lá, identificado como um "conjunto de leis vintage", passe a fazer sentido?
angelaklinke@uol.com.br

Aulão social do prof. Juan Vasquez sobre os novos Enunciados de Direito Comercial do CJF



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Eis o veículo (Motorella) que tenho utilizado para andar na ciclovia da Lagoa e ir ao trabalho sem suar