quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Empresas reveem exigência de faculdades de primeira linha na seleção

Valor Econômico - EU & Carreira - 09.09.09 - D10

Seleção natural: Elas apostam em jovens talentos formados em faculdades que não estão entre as mais tradicionais.
Empresas começam a flexibilizar exigências sobre a origem escolar


Por Roberta Lippi, para o Valor, de São Paulo

Claúdio Belli / Valor

O sucesso de Daniella Alledo como consultora da Accenture fez a empresa repensar seus critérios de contratação

"Se separarmos uma turma de jovens talentos da empresa em dois grupos, o dos formados nas faculdades de primeira linha e o dos que vieram de faculdades de segunda linha, fica claro que o segundo grupo é mais engajado e tem um nível de comprometimento diferenciado com a empresa". A frase de Rodolfo Eschenbach, líder da área de organização e talentos da consultoria Accenture, representa uma grande quebra de paradigma e reflete um movimento que começa a acontecer nas empresas brasileiras em relação a contratações de jovens profissionais e trainees.

Enquanto uma parte das organizações ainda acredita que os melhores talentos vêm das melhores universidades e usa esse critério como peso nos processos seletivos, outra parcela tem se encarregado de mudar os filtros de escolha de candidatos por perceber que estava deixando muita gente boa de fora simplesmente porque não se encaixavam a um perfil padrão.

A Accenture reviu seus critérios de seleção de trainees há três anos e retirou da peneira os nomes das faculdades. A razão inicial foi uma necessidade de suprir a demanda: a empresa não estava conseguindo preencher todas as suas vagas -em 2008, por exemplo, foram contratados 805 trainees, a uma média superior a 10 candidatos por vaga -e precisava buscar talentos em outras praças. Mas essa necessidade acabou levando a área de recursos humanos a desenvolver novos testes de avaliação de comportamentos e aptidões e, com isso, descobriu nesse novo grupo traços de flexibilidade, inteligência emocional e força de vontade que nem sempre encontrava nos candidatos que vinham das escolas "top" de linha.

Um dos casos que motivou a Accenture a romper essa barreira foi o da consultora Daniella Alledo. Formada em administração de empresas pela Universidade São Judas- que não faz parte da hipotética "lista" das escolas de primeira linha-, com um perfil considerado técnico e um nível de inglês aquém do desejado, Daniella foi contratada pela empresa para atuar em uma função técnica em recursos humanos pelo seu conhecimento em SAP, mas não tinha o perfil que a empresa buscava para a área de consultoria, seu grande desejo profissional. No entanto, quando procurou o diretor de Talentos para manifestar seu interesse em mudar, Daniella teve sua chance. E Eschenbach faz questão de ressaltar que, a partir desse exemplo, ele teve certeza que precisaria mudar o modelo de seleção da empresa. "Ela se destacava na outra área e, depois que mudou para a consultoria, tornou-se uma das melhores funcionárias da equipe, com nível de engajamento acima do normal justamente porque ela teve essa oportunidade", conta o diretor.

De fato, nem ela esperava que um dia faria parte do quadro de uma multinacional de grande porte. Com origem no interior de São Paulo e recursos insuficientes para pagar uma escola de prestígio como a Fundação Getulio Vargas (FGV), Daniella conta que sempre ouviu do pai que só se daria bem na vida quem fizesse uma faculdade de primeira linha. Hoje com 32 anos e há dois atuando como consultora da Accenture, ela valoriza a chance que teve: "Isso me motiva a melhorar sempre."

Para alguns especialistas, existe uma discussão importante por trás do estigma que foi criado pelas empresas em torno dos programas de trainees. O presidente da consultoria DBM, Claudio Garcia, explica que as organizações, especialmente as multinacionais, centraram seus esforços nos últimos anos para atrair e reter os jovens da chamada geração Y sem se dar conta de que eles ainda representam uma parcela muito pequena da população brasileira nessa faixa dos 20 aos 30 anos.

São chamados de Y os netos dos baby boomers, aqueles profissionais nascidos no pós-Segunda Guerra nos Estados Unidos. Seus pais, alcunhados de geração X, acumularam riquezas ao custo de muito trabalho, estresse e pouca - ou nenhuma- qualidade de vida, enquanto essa nova geração, gozando da estabilidade financeira conquistada pela família, busca outro tipo de relação com o trabalho. Formados em bons colégios particulares, graduados nas melhores universidades, fluentes em vários idiomas, com perfil crítico e empreendedor e, na maior parte das vezes, com vivência internacional, os Y querem fazer diferente. Esses jovens não abrem mão da qualidade de vida, gostam de realizar atividades que tragam reconhecimento e evolução rápida na carreira- de preferência, sem passar pelos sacrifícios que viram seus pais enfrentar no trabalho.

Porém, ao selecionar apenas gente com esse perfil, muitas organizações no Brasil se depararam com questões difíceis de serem administradas, como a alta expectativa e a pouca flexibilidade, muitas vezes traduzida em arrogância. "Imagine só: esses jovens vêm das melhores faculdades e depois passam por processos seletivos árduos e super concorridos. Em algumas situações, de 30 mil candidatos de um programa de trainees sobram apenas 30", diz a sócia-diretora da Across, Regina Camargo. "Ele certamente vai pensar 'eu sou o cara, agora posso relaxar'. Mas não se dá conta que a carreira dele está apenas começando", acrescenta.

As próprias instituições de ensino começam a reagir. Depois de receber um "puxão de orelha" de algumas organizações que classificaram seus alunos como arrogantes, a FGV lançou há dois anos o programa "Baixa a Bola, FGV". A coordenadora de estágios e colocação profissional da escola, Christina de Paula Leite, conta que a ação consiste em palestras nos cursos de graduação, ministradas por professores e psicólogos, que explicam aos alunos do primeiro ano que a escola estimula a proatividade, mas não a arrogância. "Mostramos que eles não são donos do mundo só porque entraram na FGV. Uma coisa é ter determinação, brilho nos olhos. Outra é se achar melhor que os outros", afirma Christina.

Um fato concreto é que alunos egressos de faculdades mais conceituadas são mais disputados e costumam ter um leque maior de opções de estágio e emprego em grandes empresas em comparação aos estudantes de escolas de menor prestígio. Quando participam de processos seletivos, os melhores alunos em geral conseguem ser aprovados em duas, três ou até quatro faculdades e se dão o direito de escolher. E são exigentes: se a empresa não atender rapidamente às suas expectativas, eles deixam a companhia e tratam de seguir seu caminho onde acharem que serão mais reconhecidos. Para estes que têm várias opções na mão, avaliam os especialistas, a paciência se mostra bem mais curta do que no caso de jovens que agarraram aquela oportunidade como se fosse a única.

É diante desse cenário que organizações começam a ampliar o foco de atuação em busca de maior diversidade na caça aos talentos. E é também nesse sentido que entra o raciocínio exposto por Garcia, da DBM. "No Brasil, o baby boom e as chamadas gerações X e Y só se repetiram nas classes A e B. Porém, no país existe muita diversidade a ser explorada", afirma o consultor. Ou seja, muitas regiões do país começaram somente agora a produzir os seus representantes da geração anterior, a X, caracterizada por profissionais mais pragmáticos, ágeis no aprendizado e pautados pelo senso de oportunidade. São aqueles que querem construir uma carreira sólida e agarram com força as oportunidades que surgem. Diferentemente da geração Y, que usufrui das riquezas financeiras que seus pais acumularam, os X precisam do trabalho para conquistar a ascensão social, profissional e econômica. "Depois que perceberam isso, diversas organizações encontraram jovens com alto nível de competitividade, motivação, boa capacidade cognitiva e uma capacidade emocional até melhor do que os chamados jovens da geração Y formados nas faculdades de primeira linha. E melhor: sem a pressão pela promoção no curto prazo e alta remuneração", completa o executivo da DBM.

Consultorias especializadas na seleção de jovens profissionais confirmam a mudança. Depois de identificar que o conhecimento e nível educacional dos estudantes não necessariamente se traduzem nas melhores competências e comportamentos esperados pelas organizações, a Across decidiu redesenhar seu modelo de contratação, dando maior foco a questões comportamentais. "Buscamos gente com potencial, e o maior indicador é a capacidade de aprendizagem. É possível medir nos processos seletivos o nível de adaptabilidade, interação com outras pessoas e como aquele jovem lida com feedbacks", diz Regina Camargo. "Se o jovem tem essas características, ele vai atrás do resto". A diretora calcula que metade dos seus clientes já compartilha dessa visão, enquanto outra parte ainda acredita que os melhores talentos estão nas faculdades mais tradicionais. "Por isso, vamos levar para os clientes duas possibilidades na hora de fazer seleção, a que acreditamos e a tradicional."

Pesquisa realizada pela Franceschini, empresa especializada em análises de mercado, mostra que 71% das organizações declaram preferir alunos de escolas tradicionais, porém apenas 15% dos profissionais recém-graduados contratados vêm dessas faculdades de primeira linha. Foram entrevistados 259 executivos de recursos humanos de companhias de diferentes portes e regiões do país. "As empresas buscam perfil de 'Super Homem' até nos recém-formados. Querem gente que trabalhe excessivamente, que atenda o telefone de madrugada se for preciso. E é difícil que pessoas que vêm de uma classe social mais elitizada tenham essa flexibilidade exigida pelas empresas", afirma Adélia Franceschini, responsável pelo estudo.

A executiva lembra ainda que, nos últimos anos, houve uma grande evolução no ensino das faculdades particulares no que diz respeito a práticas de mercado. "Na maior parte das universidades tradicionais, o corpo docente está focado e orientado para a pesquisa científica e para a busca de novos conhecimentos, seguindo o modelo de ensino francês. Já as faculdades mais recentes se voltaram para o mercado de trabalho, como o modelo americano. O que existe ainda é um preconceito com relação às escolas menos tradicionais", completa Adélia, lembrando que diversos cursos de universidades possuem pontuação de destaque no Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior, do Ministério da Educação. "A maioria dos contratantes traz as suas referências próprias do que são boas escolas, e em geral são aquelas que eram as melhores no seu tempo. Infelizmente os RHs ainda não estudam essa questão profundamente. A contratação é um processo ainda operacional."

Para a presidente da Cia de Talentos, Sofia Esteves, há dois pontos relevantes nessa discussão. O primeiro é o fato de que as pessoas que tiveram que batalhar e trabalhar para pagar a faculdade amadurecem mais rápido e dão mais valor quando conseguem um bom emprego. O segundo é que, na outra ponta, muitas organizações têm paradigmas errados em suas contratações, com frequência exigindo mais do que precisam. "As empresas perdem pouco tempo na reflexão do que é talento para elas. Querem trazer o melhor dos melhores, mas depois a pessoa vai embora porque não se identifica com aquela realidade". Novamente, trata-se da necessidade de se rever os filtros. "Será que todos realmente precisam ter inglês fluente?", questiona, lembrando que cerca de 75% a 80% dos jovens são reprovados nos processos seletivos por não atenderem ao nível desejado do idioma.

Emissão de debêntures

Valor Econômico - Finanças - 10.09.09 - C1

Mercado de capitais: Empresas aprovam nova regra da CVM e lançamentos disparam
Emissão de debêntures voltada a público restrito já supera R$ 7 bi


Altamiro Silva Júnior, de São Paulo

Um novo tipo de emissão ganhou a simpatia das empresas. Os lançamentos de debêntures com esforço restrito de colocação, que surgiram a partir de uma regra lançada em janeiro pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), já somam R$ 7 bilhões até o início de setembro, nada menos que metade do volume total de debêntures que foi emitido este ano, segundo levantamento da Associação Nacional das Instituições do Mercado Financeiro (Andima).

Empresas como TAM, CPFL, a construtora MRV, o grupo Pão de Açúcar e a Camargo Corrêa já testaram com sucesso o novo tipo de emissão. Esse grupo deve continuar crescendo. A Cyrela, com R$ 350 milhões, está entre as companhias que preparam emissões desse tipo.

A emissão de debêntures com esforço restrito só foi possível a partir da publicação da Instrução 476, que a CVM editou em 16 de janeiro. A principal vantagem para a empresa é a economia de tempo e o custo bem menor que uma operação tradicional. O prazo de estruturação de uma oferta chega a cair pela metade, de quatro meses para dois meses ou menos.

Não há, por exemplo, a necessidade de se fazer um prospecto, que exige um tempo enorme de técnicos e advogados para redigir calhamaços que chegam a superar 500 páginas. Também não há necessidade de registro da operação na CVM, como ocorre com uma oferta pública normal.

Em contrapartida, a operação tem que ser oferecida a poucos investidores, chamados de super qualificados. É um público que inclui investidores institucionais (como os fundos de pensão e as gestoras de recursos) e outros com, no mínimo, R$ 1 milhão para investir. O banco coordenador só pode ofertar a debênture a, no máximo, 50 investidores. Outra limitação é que os compradores, considerando esse universo de 50 agentes, não podem passar de 20.

"É uma forma de as empresas aproveitarem as janelas de oportunidade do mercado", diz a superintendente da área técnica da Andima, Valéria Arêas Coelho. Maior rapidez para colocação dos papéis e custo menor devem levar a uma expansão "contínua" desse tipo de emissão, avalia da executiva.

Arturo Profili, sócio responsável pela área de finanças estruturadas da Capitânia Investimentos, também acredita que as emissões com esforço restrito vieram para ficar. Não é apenas um modismo, avalia o executivo, que cuida de fundos de investimento especializados em comprar papéis de crédito privado. "É um tipo de operação que tende a se perpetuar porque é uma forma ágil de se colocar transações sofisticadas no ar."

A maioria das empresas que usou esse tipo de emissão para captar no mercado de capitais utilizou os recursos para refinanciar dívidas ou como capital de giro, mostra o levantamento da Andima. Nos piores momentos da crise, muitas companhias conseguiam lançar apenas notas promissórias, que são papéis de curto prazo (no máximo 360 dias). Com o mercado se normalizando, muitas companhias estão emitindo debêntures, com prazo um pouco mais longo (2,5 anos na média) para pagar as notas emitidas anteriormente.

As emissões de notas bateram o recorde de R$ 10 bilhões no ano passado e estão em R$ 6 bilhões este ano, até ontem. Já as debêntures somam R$ 14,7 bilhões, com um total de 29 operações. O total até este mês supera o de todo ano de 2009 (com R$ 10 bilhões e um total de 25 lançamentos), segundo dados da Andima que incluem todas as operações.

Profili, gestor da Capitânia, diz que o mercado ainda não voltou ao que era no período pré-crise e nem vai voltar por agora. As taxas estão mais altas, os prazos menores e o investidor está mais exigente, inclusive analisando mais as cláusulas que estruturam a operação em busca de mais garantias para comprar o papel. "Transações que estavam represadas estão sendo colocadas gradualmente no mercado", diz ele.

Brasil no ranking de competitividade

Jornal do Commercio - Economia - 10.09.09 - A-6

Brasil cai duas posições em competitividade


DA REDAÇÃO

Um dia após a publicação do ranking mundial de competitividade do Fórum Econômico Mundial, no qual o Brasil deu um salto de 16 posições em dois anos, alcançando a 56ª posição, o Banco Mundial (Bird) divulgou relatório sobre as facilidades para fazer negócios, no qual o País caiu duas posições, para a 129ª posição. A diferença entre os dois documentos está na metodologia de cada pesquisa. O relatório do Bird, chamado Doing Business (Fazendo Negócios) 2010, avalia a facilidade de se fazer negócios na maior cidade de 183 países. O ranking de competitividade do Fórum Econômico Mundial, por sua vez, analisa 12 quesitos, como infreaestrutura, estabilidade econômica e eficiência na educação em 133 países.

O relatório do Bird faz sua avaliação levando em consideração a burocracia que envolve todo o ciclo de vida de uma empresa, como abertura, comércio, contratação de funcionários, compra e construção da sede, pagamento de impostos e fechamento da firma. Os primeiros colocados da lista são, respectivamente, Cingapura, Nova Zelândia, Hong Kong, China e Estados Unidos. Na América do Sul, o Brasil ficou atrás da Colômbia, Chile, Peru, Uruguai, Paraguai e Argentina.



lanterna. "O Brasil está na lanterninha da região. Na América do Sul, só perde para Bolívia e Venezuela", diz Rita Ramalho, economista do Bird que trabalha no projeto. "O País fez apenas uma reforma que diminuiu o tempo de abertura de uma empresa de cinco para quatro meses, o que ainda é muito."



O Brasil se destacou por ser o país onde mais se gasta tempo com o pagamento de impostos. O empresariado brasileiro gasta em média 2,6 mil horas por ano no recolhimento de informações, cálculo, preparação de documentos e pagamento de seus impostos. Na América Latina, o tempo médio gasto no processo é de 385,2 horas, e nos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), de 194,1 horas. O segundo país onde mais se gasta tempo para pagar impostos é a República dos Camarões, onde são necessárias 1,4 mil horas por ano. Na Suíça, em contrapartida, gasta-se 63 horas por ano. Nos Emirados Árabes Unidos, são necessárias apenas 12 horas.

Em relação ao percentual de lucros que são destinados ao pagamento de impostos, o Brasil também se destacou. No País, 69,2% dos lucros são usados para pagar impostos, em comparação com 48,3% na América Latina e Caribe e 44,5% nos países da OCDE.

O Brasil é o país que exige o maior número de documentos para abrir uma empresa (16) - a média na América Latina é de 10,8 procedimentos, e na Nova Zelândia (o país mais simples), basta um. O Brasil ainda é um dos lugares onde há mais demora para se abrir um negócio (120 dias). Na Nova Zelândia, leva-se só um dia. Na América Latina, em média, são 45,5 dias. O Brasil também lidera em número de procedimentos necessários para se registrar uma propriedade (14). Para conseguir um alvará de construção são necessários 411 dias no Brasil. Em Cingapura, são só 25 e na América Latina, em média, 211.

Acionistas minoritários e o pré-sal

Valor Econômico – EU & Investimentos – 10.09.09 – D2
O direito dos acionistas minoritários no pré-sal
Edison Garcia
10/09/2009

A capitalização da Petrobras para a exploração da camada pré-sal foi o principal assunto dos últimos dias. Afinal, trata-se da empresa de maior liquidez em bolsa. Mas não é só isso que faz da Petrobras emblemática. Anos atrás, ela foi a porta de entrada para diversos investidores que durante algumas décadas estiveram distantes do mercado de capitais. Esses trabalhadores que aportaram suas poupanças em FGTS, ou mesmo dinheiro próprio, na compra de ações encontram-se apáticos ante o modelo proposto na Petrobras. Uma vez no pré-sal, o próximo passo pode ser o espeto.
Conforme vem divulgando, a Petrobras espera que a capitalização e a cessão dos direitos de exploração dos até cinco bilhões de barris do pré-sal ocorram simultaneamente. Para isso, a União divulga que sua participação no aumento do capital será paga com títulos públicos, equivalentes ao que resultar na precificação do contrato de cessão de direitos.
O grande ponto dessa operação também está na avaliação desses direitos. Ao considerar a cessão como um mero contrato comercial, a Petrobras busca a liberdade para aprovar o negócio sem a manifestação dos acionistas minoritários. Há de se lembrar que estamos diante de um contrato entre partes relacionadas, que a lei faculta desde que seja feito a preço justo e de mercado.
No roteiro deste filme, o trabalhador que usou sua poupança do FGTS ou suas economias para experimentar o mercado acionário brasileiro só poderá comprar novas ações com dinheiro. Já o acionista majoritário sinaliza que poderá comprar novas ações com bens, cessão de direitos ou títulos que não se sabe bem a qual preço. Essa história, como vem se desenvolvendo, sinaliza capítulos mais tenebrosos. A engenharia criativa por trás dessa operação está a propor a esse mesmo minoritário que o direito que a lei atual lhe dá - de opinar sobre a proposta, apoiando-a ou rejeitando-a - será caçado sem dó nem piedade.
O aumento do capital social de uma Sociedade Anônima (S.A) deve observar os critérios utilizados na constituição da companhia para a formação do capital (artigo 170 da Lei das S.A). Ou seja, em dinheiro ou bens. Desnecessário explicar que o dinheiro, citado na lei, é moeda corrente nacional, algo diferente de bens ou direitos, valores mobiliários e títulos, que são suscetíveis de avaliação, com a finalidade de dar sua equivalência patrimonial a dinheiro.
A Lei das S.A dispõe, de forma clara (artigo 8), que os bens estarão sujeitos a uma avaliação por peritos ou empresas especializadas. No mesmo artigo, menciona que "se a assembleia não aprovar a avaliação, ou o subscritor não aceitar a avaliação aprovada, ficará sem efeito o projeto de constituição da companhia" (por analogia, o aumento de capital).
Nesse artigo (parágrafo 5º), determina-se que a assembleia que deliberar sobre esse laudo de avaliação deverá aplicar o disposto no artigo 115 (parágrafo 1º e 2º). Tal trecho não deixa margem de dúvidas ou interpretações: "O acionista não poderá votar nas deliberações da assembleia-geral relativas ao laudo de avaliação de bens com que concorrer para a formação do capital social e à aprovação de suas contas como administrador, nem em quaisquer outras que puderem beneficiá-lo de modo particular, ou em que tiver interesse conflitante com o da companhia."
Em voto proferido em 2002 (Inquérito Administrativo 1.153), o então presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Luiz Leonardo Cantidiano, ressaltou, com base nesse mesmo artigo 115, que "quando o acionista contribui para o capital, com um bem do qual ele seja titular, ele está proibido de votar". E destaca que "não há qualquer dúvida quanto ao impedimento de voto". Esse entendimento diverge da tese que vem sendo trazida pela estatal de que títulos ou contrato comercial de cessão de direitos faz desnecessária a participação de acionista minoritário.
O mercado brasileiro tem sido visto como excelente opção de investimento, principalmente por estrangeiros. Um dos pilares para essa atratividade é o esforço em prol das boas práticas de governança corporativa e da defesa dos direitos dos minoritários. O país não precisa de nenhuma mácula com a insegurança jurídica ou com o desrespeito aos direitos dos acionistas. Seria injusto que os minoritários, inclusive os do FGTS, não opinem quanto ao valor do ativo para formar o capital - e ainda tenham de pagar unicamente em dinheiro, enquanto o acionista majoritário aporta direitos. É o mesmo que escolher entre a brasa e o espeto.

Edison Garcia é superintendente da Associação de Investidores no Mercado de Capitais (Amec)
E-mail: edisongarcia@amec brasil.org.br

Registre as histórias, fatos relevantes, curiosidade sobre Paulo Amaral: rasj@rio.com.br. Aproveite para conhecê-lo melhor em http://www2.uol.com.br/bestcars/colunas3/b277b.htm

Eis o veículo (Motorella) que tenho utilizado para andar na ciclovia da Lagoa e ir ao trabalho sem suar