terça-feira, 28 de outubro de 2008

Riscos do ativismo judicial nas políticas públicas

Valor Econômico - Legislação & Tributos - 27.10.08 - E2

Direitos sociais e o ativismo judicial
Diogo R. Coutinho e Octávio Luiz Motta Ferraz

A constitucionalização de direitos sociais foi sem dúvida uma vitória da democracia. No Brasil, é razoável supor que direitos sociais previstos diretamente na constituição - como direito à saúde, educação, moradia, entre outros - são mais robustos e provavelmente mais eficazes que direitos enunciados em normas infraconstitucionais.

É óbvio, porém, que a mera constitucionalização desses direitos não é suficiente. Nesses 20 anos de constituição houve sem dúvida avanços sociais importantes, como a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), a redução da mortalidade infantil, o aumento do acesso à educação e da alfabetização da população. Mas apesar desses avanços -- e da recente euforia com o crescimento da classe média e a pequena redução das desigualdades - é fato que continuamos sendo um dos países mais desiguais do mundo e estamos longe de poder ostentar os indicadores sociais que nosso porte e potencial econômico nos facultariam.
Nesse contexto, não é surpreendente constatar que o Judiciário vem exercendo um papel ativo na implementação de certos direitos sociais no Brasil, ordenando ao Estado, por exemplo, o fornecimento de medicamentos e procedimentos médicos não disponíveis no SUS e a garantia de acesso a vagas em escolas e creches superlotadas. Ora, se trata-se de direitos constitucionais, dizem os defensores do ativismo judicial, é função do Judiciário interferir para garantir o seu cumprimento sempre que o Executivo e o Legislativo deixarem de cumprir suas obrigações. O contrário, ou seja, uma atitude passiva de nossos juízes, poderia equivaler a uma verdadeira abdicação de sua principal missão constitucional.
A atraente simplicidade desse argumento é, no entanto, enganosa. Ele nos impede de enxergar e discutir com a devida profundidade as dificuldades e problemas que a judicialização das políticas públicas sociais necessariamente implica. Deve-se lembrar, em primeiro lugar, que o Judiciário tem características estruturais e institucionais que restringem significativamente sua capacidade de promover mudanças sociais abrangentes. É difícil de imaginar, por exemplo, a criação e implementação de uma política pública da magnitude do SUS, do Bolsa Família ou do Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS), por ordem judicial. Programas dessa dimensão requerem complexas medidas legislativas e administrativas que dependem, em última instância, da combinação de vontade política e expertise técnica para as quais o Judiciário não é capacitado, vocacionado ou legitimado. Além disso, medidas desta abrangência dependem diretamente da arrecadação e alocação de volumes significativos de recursos. Novamente aqui o Judiciário não tem expertise ou legitimidade para ordenar e administrar tais tarefas.
Nesse contexto, o papel de um Judiciário ativo no campo dos direitos sociais fica necessariamente restrito a medidas pontuais, nas margens do sistema, como a concessão de um medicamento aqui, uma vaga em creche ali etc.
Mas o risco da interferência judicial nas políticas públicas sociais não é a mera inocuidade. Há também a possibilidade real de se modificar, para pior, programas que, embora imperfeitos, foram pensados e implementados por especialistas. Pior que isso, como as demandas que chegam ao Judiciário são na sua grande maioria individuais, o ativismo judicial pode causar um efeito ainda mais perverso: sem conseguir medir impactos distributivos de suas decisões, juízes voluntaristas e bem-intencionados podem estar privilegiando aqueles que, por terem recursos para pagar um advogado, "furam a fila" das políticas públicas universais geridas pelo Executivo. Exemplo claro disso vem ocorrendo diariamente na área da saúde.
Não estamos sustentando, queremos deixar claro, que juízes não possam (e devam) exercer algum tipo de controle sobre essas políticas públicas. Mas a pressuposição deve ser a de que o legislador e o administrador público são, em princípio, mais legitimados e capacitados para pensá-las e articulá-las. Partimos da premissa de que o controle judicial de políticas públicas é, em regra, insuficiente para provocar mudanças sociais amplas e, quando mal calibrado, pode causar mais danos que benefícios na busca da realização do princípio constitucional da Justiça social.
Diante desse quadro, a revisão judicial de políticas públicas sociais deve limitar-se a um controle de procedimentos e de razoabilidade na definição de prioridades distributivas, bem como dos meios para pô-las em prática. Mesmo dentro desse âmbito mais restrito, o Judiciário pode exercer um papel importante e mais efetivo, a exemplo do que vem ocorrendo em outros países como na África do Sul e na Inglaterra. O Judiciário está bem posicionado institucionalmente para exigir do administrador, por exemplo, transparência e racionalidade na alocação de recursos para as áreas sociais. Pode fiscalizar ainda a efetividade da participação popular nesse processo, garantindo o real funcionamento dos diversos mecanismos do chamado controle social, como os conselhos de saúde e educação. Em casos em que não houver política pública alguma - situações de pura omissão pelo Legislativo, por exemplo - aí sim os juízes devem esforçar-se mais assertivamente para romper a inércia do legislador, procurando dar sentido aos direitos previstos na constituição.
Quando nos conscientizamos desses importantes limites da atuação judicial podemos então enxergar e enfatizar outras formas de controle que um regime democrático oferece e que, por motivos políticos e históricos, não funcionam como deveriam no Brasil. É essencial, por exemplo, que haja pressão efetiva da população sobre os poderes políticos para que destinem recursos suficientes do orçamento às políticas sociais. É preciso ainda que a população mais carente participe desde a concepção destas políticas até a fase de implementação, quando são definidos, muitas vezes por meio de "escolhas trágicas", seus ganhadores e perdedores, para que não continue sendo preterida em favor da classe média cujo poder de barganha é maior.
Nesse contexto, um dos papéis mais importantes que o direito pode desempenhar no desenvolvimento do país é o de construir e articular instituições, dividindo claramente responsabilidades entre atores públicos e privados, desenhando arranjos coerentes para assegurar que objetivos se convertam em ações e que não haja sobreposições, lacunas ou rivalidades contraproducentes que obstruam a eficácia das políticas públicas. O ativismo judicial na área dos direitos sociais, ainda que bem-intencionado, não contribui para esse objetivo.
Diogo R. Coutinho e Octávio Luiz Motta Ferraz são, respectivamente, professores de direito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade de Warwick, no Reino Unido

Dicas de negociação

Valor Econômico - EU & Carreira - 27.10.08 - D8

Um negociador de sucesso é aquele que pensa no outroPor Luiza Dalmazo,
de São Paulo

Ser um hábil negociador é uma competência fundamental para quem atua no mundo dos negócios, especialmente nesse momento de crise. É preciso, mais do que em outras situações, saber lidar com credores, funcionários, clientes e acionistas, todos com emoções alteradas. "É uma situação atípica da negociação, por conta dessa ansiedade incomum", afirma Maria del Pilar Galeote Muñoz, sub-diretora do Centro de Negociação e mediação do IE Business School.Jefferson Dias / ValorPara Maria del Pilar Galeote Muñoz, do IE, nesse momento crítico é preciso pensar em negociação de interesses, aquela em que as duas partes saem ganhandoNesse momento crítico é preciso pensar em negociação de interesses, aquela em que as duas partes saem ganhando. "Nós chamamos de negociação de convencimento, que na verdade se escreve 'com-vencimento', uma forma que mostra o ganho de ambos", afirma a executiva que esteve no Brasil para fazendo palestras para ex-alunos do IE, na Fundação Getúlio Vargas, parceira do instituto, entre outros encontros.O conceito ganha-ganha foi criado na Harvard Business School, segundo Max H. Bazerman, professor de negociação da escola de negócios. Ele desmistifica a idéia de que "o que é bom para mim é ruim para o outro".Em tempos de negócios e crises globais, além de preocupar-se com itens tradicionais de negociação, hoje é preciso avaliar o tema sob o aspecto internacional. Isso, entretanto, não significa aprender os estereótipos de cada povo. Na opinião de Pilar, a principal dica para quem lida com transações com outros países é estudar as características gerais de cada cultura - principalmente separando as orientais, nórdicas e latinas -, para garantir que será um bom anfitrião. É preciso respeitar eventuais diferenças e entender as peculiaridades.Segundo Pilar, no Brasil o processo para fechar uma companhia é tão longo, que garante aos negociadores tempo suficiente para discutirem e chegarem a um acordo com os credores. É diferente do que acontece na Espanha, que entre a comunicação de falência e o fechamento dos negócios passam-se apenas seis meses. "Até mesmo os sindicalistas são adeptos da negociação de interesses, ao contrário do que se imagina, que eles impõe suas vontades e ponto final", diz.Ela lembra que se você num negócio tentar tirar muita vantagem sobre o lado oposto, há um grande risco de essa pessoa perceber a sua jogada e nunca mais concordar em sentar em uma mesa para negociar com você. Ou também há uma chance dela não cumprir o contrato. Isso é uma perda grande e um preço alto demais para se pagar em acordos. Por isso, a principal dica da professora de negociação é descobrir os principais interesses da outra parte. Antes de se sentar efetivamente para conversar, vale pesquisar a vida da pessoa, seus possíveis interesses. Ouvir atentamente a outra parte na hora de negociar também é bem importante. O próximo passo é estudar todas as implicações de cada uma das possibilidades no acordo, segundo ela. "Cerca de 75% do crédito pelo êxito de uma negociação se deve à preparação, que inclui a busca por informações e o estabelecimento da estratégica e da tática que serão aplicadas", estima.Outro item fundamental é a comunicação. Se a pessoa não conseguir expor as idéias com eficiência, a preparação pode não valer nada. "E faz parte da comunicação começar a conversa de um jeito leve, sem ir direto ao ponto crítico", destaca. Ao contrário do que se imagina, restaurantes não são os locais mais indicados para se marcar e fazer negociações. Como isso é muito comum no Brasil, Pilar diz que não é preciso se recusar a ir. Mas nunca feche o negócio nesse ambiente. "Existem pessoas muito boas em tratar de sutilezas em momentos de aparente descontração, como o da sobremesa e o mais distraído pode ser afetado", afirma. Se não tiver jeito, procure um restaurante que freqüente, que se sinta a vontade, conheça o cardápio e a localização do banheiro - isso ajuda a manter a tranqüilidade.Apesar de ser um tema que possui teoria para aprendizado, a habilidade de negociar é algo que se pratica em atividades rotineiras e que se aprende também com relatos de quem está vivenciando processos. A disciplina, que surgiu em Camp David, acordo de paz que deu origem ao tratado de paz entre Israel e Egito, é algo que hoje faz parte de todos os cursos do IE. "É um tema novo mas que começou a ficar forte nos cursos há 10 anos", diz. A diferença entre o que se ensina de bom e ruim, segundo Pilar, são os chamados truques. "Eles não funcionam, isso está fora das aulas sérias".Bazerman, o professor de Harvard, lista pequenas dicas - não truques - para que você se saia melhor em negociações, especialmente as mais tensas geradas pela crise: construa um ambiente de confiança e troque informações; pergunte de um jeito que você também não se importaria de responder; esconda algumas informações; faça diferentes ofertas simultaneamente, pois pelo menos você vai descobrir o que é mais importante para o outro. Por fim, ele sugere que você faça concessões, para garantir o sucesso de um acordo. "Mas nunca faça todas de uma vez". Segundo ele, as pessoas tendem a valorizar mais se você as fizer em parcelas.

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Eis o veículo (Motorella) que tenho utilizado para andar na ciclovia da Lagoa e ir ao trabalho sem suar